29.12.06

ficção VII

O despertador não tocou, calou-o antes da hora marcada. Não ouve chover, está acordado há mais de meia hora e ainda não ouviu a chuva. Desde que tomou a decisão de se envolver na “notícia” que pensa na melhor forma de solucionar esta ansiedade em penetrar no contexto do acidente. É o assassino que lhe interessa, deve estar enclausurado, vai ser difícil a aproximação, vai exigir que se desloque à capital regularmente e em horários pós laborais. Ontem, antes de adormecer, pensou em várias hipóteses para estabelecer uma relação com o criminoso. Qualquer uma delas exige dotes de representação: pensou em fazer-se passar por padre, por jornalista ou um académico. Move-o uma vontade renascida de expurgar um ódio há muito escondido nas profundezas da alma, guardado no mais secreto dos confins da imaginação, na mais reprimida das emoções.
É esta energia renascida que o faz sair da cama num ápice, ligar a hi-fi, abrir o leitor de cd’s e pôr a cavalgada das valquírias a tocar. Toma banho, faz a barba, veste-se e toma o pequeno-almoço enquanto traça os planos para o padre, o jornalista e o académico. A ideia é escolher a hipótese mais viável e o plano mais realista. Pensa na importância da primeira abordagem, na confiança que desde logo tem que ganhar ao criminoso, nas viagens, nas falsificações de documentos, em todo o trabalho que uma credível encarnação de um personagem envolve e em todos os riscos que isso acarreta. Quando sai de casa e olha o céu cinzento e a calçada seca, tem já decidida a personagem que vai encarnar: um académico estudante de psicologia a fazer um mestrado ou doutoramento (isto ainda não decidiu) sobre constrangimentos morais em homicidas involuntários.

1 comentário:

ana disse...

Eia! Eia! Finalmente consegui ler mais um bocadinho deste livro de suspense! E continuo suspensa na espera de novos desenvolvimentos... Despacha-te! Beijo.