29.3.10

um deus desenha dor

às vezes apetecia-me ser um deus de lápis atrás da orelha só para poder apagar e redesenhar algumas coisas do mundo que vejo.

22.3.10

o dia de noite

o despertador ainda não tocou e ele já está a acordar num daqueles dias em que o seu corpo se sente em sintonia com o universo. os dias e as noites não precisam das horas e o seu corpo sabe às quantas anda. estranha não ver claridade nenhuma a entrar pelas arestas da janela. levanta a cabeça da almofada e confirma que é de noite. não costuma acordar tão naturalmente saciado de sono sem que haja uma luminosidade ténue no quarto. os números a vermelho que marcam 7:32 no telemóvel e são a maior fonte de luz no quarto. àquela hora não é normal, muito menos em maio.

levanta-se devagar e a achar que o relógio do telefone está avariado. faz o percurso em modo de meio-a-dormir-às-escuras até à sanita. enquanto alivia a bexiga, confirma que lá fora só as luzes dos candeeiros e das estrelas iluminam a escuridão. regressa ao quarto cauteloso e esforça-se por não a acordar, tropeçar numas meias suas ou nos seus chinelos. apalpa cuidadosamente a mesinha de cabeceira dela e consegue encontrar o seu telemóvel: 7:34. não pode ser. é tão de noite como às duas da manhã numa madrugada de dezembro. os dois telefones com as horas trocadas. pousa o telefone e vai para a sala. acende o candeeiro de canto e a televisão. o serviço de tv diz que são 7:35. estamos em maio, são 7:35 da manhã e diz que é de noite. só pode ser um vírus que chegou a tudo que é equipamento electrónico, uma catástrofe mundial.

apressa-se para o quarto, agacha-se ao lado dela e tenta acordá-la com calma. ela pergunta se o despertador já tocou, ele responde que não mas que já são vinte para as oito… e é de noite! – o quê? estás doido? - não, não estou, olha para a janela! – não consigo, porque é que a abriste toda? neste momento pergunta-se a ele próprio como é que ela sabe que a janela está escancarada se ainda nem tirou a cabeça debaixo dos lençóis. ela estranha o silêncio dele ali ao lado da cama e a olhar para a janela. - o que foi? – pergunta-lhe. - como é que sabes que a janela está escancarada? ela, por momentos, pensa que está a sonhar de tão absurda que é a pergunta. não, não está a sonhar e responde: - só se tivesses tirado o tecto é que havia mais claridade no quarto! que horas são? – vinte para as oito, já te disse. vinte para as oito e eu não vejo claridade nenhuma, para mim é de noite. depois de dizer isto, passa a acreditar que aconteceu algo durante o sono que lhe afectou a visão. não há nenhum vírus electrónico, os seus olhos é que estão avariados.

continua sem se mexer ao lado da cama e ela, como se lhe sentisse o ritmo cardíaco a acelerar e o seu espanto a transformar-se em preocupação, tira a cabeça debaixo dos lençóis e olha para ele com a cabeça erguida e os olhos semicerrados. assusta-se com o ar assustado dele e pergunta-lhe o que se passa. ele responde-lhe que vê tudo escuro. – como assim? não vês nada? estás cego? o que se passa? – vejo mas não estou cego, vejo o dia de noite. dito isto levanta-se a correr, liga a luz do tecto e vai à procura do lugar no céu onde àquela hora devia estar o sol. devia. devia porque só vê estrelas e a lua num quarto crescente, nada de sol.

entretanto ela aparece na porta da sala a acabar de atar o cinto do roupão. ele volta-se e vê-a a olhar para ele, assustada, com os olhos cerrados e a mão esquerda a fazer de pala na testa. agora é ele que lhe sente o ritmo acelerado. olha para o lugar no céu onde deveria estar o sol e pergunta-lhe se ela o consegue ver. ela diz que não consegue olhar para ele mas que está lá, no lugar onde deve estar. – não o vês? – não… venho já! sai a correr, vai ao quarto, veste o roupão e vai à rua: carros a passar ordeiramente de luzes desligadas, pessoas com cabelos a acabar de secar, óculos de sol, um homem a passear um cão, outro saudável a fazer jogging, aromas a perfumes matinais misturados com fumos de escapes, movimento na rua a fazer adivinhar a hora de ponta. as pessoas que passam por ele, ali especado de roupão, olham-no com desdém, a troçar, surpreendidas por verem aquele sujeito despenteado e de barba por fazer, ali, de roupão e no meio da rua. um louco, só pode ser. 

um louco é também o que ele pensa dele próprio naquele momento. um personagem saído de um episódio do twilight zone, dum filme do m night shyamalan ou de um livro do stephen king. regressa a casa, liga o portátil enquanto vai buscar uma maçã que come em meia dúzia de dentadas. tira um café. larga o caroço ao lado da máquina de café, agarra na chávena, leva-a para a sala e pousa-a ao lado do computador. abre a garrafa de água, espera ter a maçã bem engolida e bebe três goles cheios. afasta a cadeira, senta-se, pousa a mão sobre o rato e abre o word. acende um cigarro e começa a escrever: o despertador ainda não tocou e ele já está a acordar num daqueles dias em que o seu corpo se sente em sintonia com o universo.

13.3.10

evolução (?)


Elementar, meu caro. Vem aí o supercomputador da IBM

"Ocupa o espaço de vários estádios de futebol, chama-se Watson"

"Será o primeiro computador a entender linguagem natural e a responder da mesma forma, em vez de fazer uma busca interna na base de dados à procura do item que corresponde à questão".

11.3.10

portugal: algumas palavras-chave

crise, políticos, corrupção, escutas, sócrates, ps, psd, partidos, candidatos, pt, rtp, tgv, analista, comentador, comissão de inquérito, função pública, défice, suspeitas, segredo de justiça, … dass! que fartura!  

9.3.10

novas oportunidades? - muitas vezes não, às vezes sim

EFAs, Educação e Formação de Adultos: as novas oportunidades. há quem não goste, há quem diga mal, há quem tenha razão, há muita gente a mamar à pala da europa. a europa, essa acha que somos burrinhos e precisamos de aprender mais umas coisitas do mundo e da vida. o governo concorda e canaliza milhões para que os bastardos da revolução de abril ensinem os que não puderam ou não quiseram aproveitar à primeira oportunidade. mesmo que tenham 40, 50 ou 60 anos, há – realmente - quem aproveite esta nova oportunidade para aprender e crescer. como em tudo na vida, há de tudo. 

do lado de cá, há gente empreendedora e há amigos que acreditam que a amizade também é sermos uns p'ros os outros. p´ra mim, bastardo verde da sociedade (por causa dos recibos), freelancer da educação, há mais uma nova oportunidade e um contrato de trabalho a caminho, é numa associação cultural e recreativa. mais uma aventura profissional que isto da instabilidade também tem coisas positivas: o trabalho nunca é igual em dois dias seguidos e temos sempre a oportunidade de aprender com novas pessoas (e sobre as pessoas, novas ou velhas). haja saúde e bem hajam os Amigos!

2.3.10

genuinidade

dos quase 33 anos que tive o privilégio de viver, poderia falar e escrever horas a fio, dias, semanas sem parar até me cansar de me ouvir a mim próprio de dentro do meu cérebro. hoje, agora e a propósito ou não, lembro-me de genuinidade.

por cada infindável número de acontecimentos que nos dão alegria, há um interminável número de tristezas que acompanham as primeiras. ora em forma de rima cruzada, ora em forma de rima emparelhada ou solta, as tristezas e alegrias vão caminhando por entre as nossas vidas afora como condições obrigatórias desta coisa que se chama existência.

tenho a sensação que à medida que vou crescendo, vou tendo mais dificuldade em intuir a genuinidade nesta ou naquela pessoa. talvez porque esteja mais atento e não esteja para investir ou perder tempo com a superficialidade das coisas, talvez porque relação e superficial sejam antónimos, talvez porque as pessoas não estejam verdadeiramente dispostas a conhecerem-se e darem-se a conhecer. talvez por isto tudo e talvez por nada disto, as tristezas trazidas pela falta de genuinidade parecem ter a tendência a ser mais do que as alegrias vindas em forma de pessoa genuína. há pessoas genuínas, há mas não são muitas. conserva as que tens e dá-te por feliz quando encontrares alguma.